O julgamento que decorre em Londres sobre as dívidas ocultas contribui para expor alguns contornos sobre como verdadeiros ‘tubarões financeiros’ internacionais se fazem milionários, a partir de empréstimos concedidos a países vulneráveis, que ganham “coragem” de irem buscar dinheiro ou financiar projectos a partir desses mercados.
Já não é notícia a estória das “50 mil galinhas”, embora Jean Boustani, um dos principais actores desta saga, diga que só desembolsou 17 mil para a dupla Teófilo Nhangumele e Bruno Langa.
Quanto às “33 mil galinhas”, ficou amnésico, garantido apenas que não foram para a “conta do Júnior” [Ndambi Guebuza]. Isso são as inverdades de Nhangumele. Pouco se tem falado dos 10 milhões que foram parar à Pereira do Lago [Partido Frelimo] ou as “contribuições” para a campanha do “New Man” [Uma referência a Filipe Nyusi].
A espia sul-africana recebeu uma comissão de U$6 milhões pelo lobby e apresentações no aparelho securitário.
O já defunto Credit Suisse terá cobrado U$6 milhões como taxa de serviço para preparar o empréstimo de U$372 milhões, e depois exigiu U$49 milhões como subvenção deduzida do empréstimo na fonte. Graças à intervenção de Andrew Pearse, a subvenção reduziu para U$38 milhões. No entanto, Pearse terá recebido U$5,5 milhões pelo esforço.
Boustani diz que não foi bem assim, e que na verdade se tratou de um “paraquedas doirado” para Pearse sair da Credit Suisse e vir formar a Palomar como braço de investimento da Privinvest, detido aparentemente em 66% por nada mais nada menos que Safa e o seu irmão, e 33% por Pearse e parceiros. O enredo se adensa quando se alega que o acordo parassocial é de que 10% de qualquer transacção organizada pela Palomar para a Privinvest constituiriam as receitas da sociedade. A primeira acção foi para organizar o empréstimo a Mozambique Asset Management (MAM). A VTBC empatou $550 milhões. Os três projectos (Proíndicus, EMATUM e MAM) – também conhecidos eufemisticamente por “três marias” – contrataram empréstimos num total de U$2,2 biliões. O resto é só fazer a aritmética.
Como Boustani era generoso, ofereceu $1 milhão a um tal de Louvier por ter apresentado a VTBC que viria a ser o financiador principal da MAM. Quando indagado, aí ele disse que pode ter sido por ter apresentado mais de uma pessoa…. Mas como havia muito pretendente, apareceu mais alguém a reivindicar que tinha sido ele a “descobrir” a VTBC. Aí tiveram que sair mais U$500 mil para o segundo apresentador da mesma instituição…. Esses foram retirados do paraquedas doirado do Surjan Singh, que não tinha honrado a promessa de sair do Credit Suisse para se juntar à Palomar dos Safa e Pearse, segundo Boustani
Outro pedaço de ouro foi contado por um tal Valentine, a quem que foi adjudicado um contracto para a construção de um estaleiro naval no âmbito do projecto da MAM. Ele apresentou um projecto de U$65 milhões. Acto continuou recebeu um incentivo da Privinvest: qualquer poupança que fizesse receberia 33% do valor poupado. Não se sabe se a lógica era exagerar o preço para apresentar “poupança” ou mesmo um incentivo para “poupar”. De ajustamento em ajustamento o projecto acabou tendo um custo final de U$25.5 milhões. Mas o empreiteiro disse ao tribunal que não chegou a receber o incentivo prometido. Uns U$11 milhões lineares por aí. Mesmo assim, disse estar feliz por ter feito um trabalho de que se orgulha.
Para não pensar que são só os financeiros e empreiteiros que lucram nestes negócios, é bom não esquecer os batalhões de advogados: só os que representam a Moçambique não devem ter facturado menos de U$100 milhões. Nas últimas contas falava-se de U$80 milhões, mas pode ser que seja muito acima.
Por isso é que o caso de Moçambique aparece como o trabalho mais proeminente no website da Peters and Peters (P&P) pois não aparece nenhum outro caso a mexer com U$2.2 biliões. Portanto, quer se perca quer se ganhe, a P&P já esta vestida de prestígio.
Imaginem-se as fortunas despendidas nas sete ou oito equipas; cada um a facturar junto do respectivo cliente e a negociar acordos extrajudiciais. E quem paga estas facturas todas? Ah, aí o leitor acertou na resposta certa: Os mesmos povos defraudados e vulneráveis que nem água potável para beber têm.
As eminências que desfilam por este julgamento não vivem certamente no mesmo universo nem respiram o mesmo ar que nós os restantes mortais.