A Polícia da República de Moçambique (PRM) tentou, na manhã desta segunda-feira, impor uma “marcha silenciosa”, convocada pelo MISA – Moçambique, em repúdio ao assassinato, semana passada, do jornalista e director editorial do semanário Ponto por Ponto, João Chamusse.
Logo cedo posicionados no local combinado por jornalistas como ponto de partida, elementos da Polícia lá estavam e à hora de partida exigiram que a marcha não ocorresse, tal e qual havia sido desenhada. Uma das propostas policiais era a indicação de um representante para que, sozinho, marchasse até à Procuradoria-Geral da República (PGR), instituição na qual deveria depositar uma petição de repúdio e exigência de esclarecimentos cabais das reais circunstâncias por detrás da morte do jornalista e director editorial, João Chamusse.
Diante da exigência, os jornalistas rejeitaram-na imediatamente e deixaram claro que estavam naquele local para cumprir com o acordado, que era uma caminhada pedestre até às instalações da Procuradoria-Geral da República. Com uma e outra discussão, a Polícia acabou percebendo que não tinha como impedir a marcha da classe jornalística, pelo que se colocou a fazer a devida e necessária escolta.
Já a meio da caminhada e diante de cânticos exigindo justiça e cabal explicação da morte do colega de profissão, os jornalistas colocaram a Polícia bastante nervosa. No imediato instante, a esta [Polícia] parou a marcha e exigiu que os manifestantes mantivessem silêncio. Ou seja, na linguagem da Polícia, a marcha devia ser “silenciosa”.
Mais uma vez, exigência feita e imediatamente rejeitada. Os jornalistas deixaram claro que não se calariam, até porque a sua profissão é essa: dar voz aos sem voz, no âmbito do exercício e direito constitucional de informar, ser informado e viabilizar as liberdades de imprensa, de expressão e de opinião.
Efectivamente, os cânticos continuaram e a Polícia voltou a notar que não tinha como manter aquela exigência.
Petição entregue
Já na Procuradoria-Geral da República, o presidente do Misa Moçambique, Jeremias Langa, e o advogado João Nhampossa foram depositar a petição exigindo melhor e cabal esclarecimento da morte do também antigo editor interino do mediaFAX.
Essencialmente, a petição vai no sentido de cobrar ao Ministério Público o cumprimento das suas obrigações legais, enquanto titular da acção penal. Ou seja, deve conduzir uma investigação séria e profunda em torno do assassinato do jornalista, João Chamusse.
Segundo a exigência, ter informações sobre os autores, as motivações e as circunstâncias do assassinato é importante para a liberdade dos jornalistas, comentadores e cidadãos do país.
Por outro lado, foi dito que o Misa – Moçambique vai constituir-se em assistente do processo no sentido de acompanhar todas as diligências e assegurar que o MP cumpra, de facto, o seu papel, sem cair no dilema de prender para investigar
Estado violador de direitos
Presente no grupo dos cerca de 100 marchantes, o activista e director do Centro para a Democracia e Direitos Humanos (CDD), Adriano Nuvunga, mostrou-se visivelmente agastado com as tentativas de impedimento da marcha, por parte dos agentes da Polícia da República de Moçambique. Tal como Nuvunga, outros activistas da sociedade civil juntaram-se à causa dos jornalistas para exigir justiça.
O elevado número de agentes policiais, alguns à paisana, para uma manifestação de jornalistas, fez com que Adriano Nuvunga voltasse a questionar o facto de, apesar de existirem tantos agentes da lei e ordem, o país continuar a registar diversos casos criminais.
“Estão aqui os polícias. Estão aqui os piqueiros [agentes do Serviço de Investigação Criminal], os cinzentinhos [Polícia de Protecção], num país em que há uma série de crimes que não são esclarecidos. Mas quando os jornalistas, esta classe que faz falar aos que não tem voz, quer marchar está a ser seviciada, ameaçada, assustada, etc. Isso mostra um Estado que é um abusador e violador de direitos, que está contente [o Estado] com o assassinato de jornalistas.
Por outro lado, o facto de, em algum momento, os agentes terem-no apontado o dedo, alegadamente questionando por que razão fazia parte da marcha se ele [Adriano Nuvunga] não era jornalista, deixou-o bastante revoltado.
“Eu sou um activista deste país. Sou amante das liberdades. Vim aqui porque sem jornalistas eu não existo. E entendo o trabalho dos jornalistas. Sem eles, não existo. Sem eles, a sociedade não progride. No dia que os seus direitos são violados, no dia em que um deles é assassinado, assassinaram a todos e a cada um de nós. Por isso, estaremos aqui”, disse Nuvunga.