O Governo moçambicano pautou pela ausência na abertura da quarta conferência africana sobre a dívida e desenvolvimento (AfCoDD IV), um evento que discutiu os impactos da dívida no desenvolvimento dos países africanos e que hoje termina na cidade de Maputo.
Segundo Adriano Nuvunga, director-executivo do Centro da Democracia e Direitos Humanos (CDD), o Governo como entidade responsável pela gestão das contas públicas e parceiro das organizações da sociedade civil, foi convidado, através do gabinete do primeiro-ministro, Adriano Maleiane, a fazer parte do evento. Contudo, sem justificação, pautou pela ausência, o que até certo ponto demonstra arrogância e falta de respeito para aqueles que contribuem para as contas públicas.
Co-organizada pela Rede Africana sobre Dívida e Desenvolvimento (AFRODAD), Macroeconómico Nawi Afrifem (Nawi), CDD e a Campanha Stop the Bleending (STBC), a reunião da AfCoDD IV, que iniciou nesta quarta-feira, arrancou com atraso, porque os organizadores do evento aguardavam pela chegada de um representante do Governo.
Coube ao director-executivo do CDD proferir o discurso de abertura que se focalizou em três pontos. Nuvunga recordou aos participantes, provenientes de vários países do continente africano, que Moçambique é um país que vive o fantasma da dívida que está a hipotecar o futuro de gerações e gerações.
Sublinha que, devido aos encargos da dívida, o Governo moçambicano até tem dificuldades de pagar salários aos funcionários públicos. Sublinhou que para o executivo pagar salários ou qualquer despesa recorre ao endividamento.
“Mesmo para a compra de um papel higiénico, o Estado moçambicano recorre à dívida”, ironizou.
Devido aos altos encargos da dívida, o Governo já não pode recorrer a credores externos, e, como solução, recorre ao mercado interno, prejudicando o sector privado que precisa dos mesmos fundos para financiar seus negócios.
Para Nuvunga, é lamentável que um país tão rico em termos de recursos viva numa situação de pobreza extrema porque, as pessoas encarregadas da gestão dos bens públicos olham para os seus umbigos em detrimento da esmagadora maioria dos moçambicanos.
“Hoje há governantes moçambicanos que têm residências de luxo em cidades como Dubai [Emiratos Árabes Unidos], uma realidade que contrasta totalmente com a vida da maioria dos moçambicanos”, disse.
Nuvunga abordou também a questão das calamidades naturais como outro fenómeno que, a par da corrupção, estão a arrastar o país para o abismo.
De acordo com o director-executivo do CDD, a situação vivida em Moçambique é similar a de muitos países africanos, onde a engenharia de governação desenhada pelos seus dirigentes não se foca no desenvolvimento colectivo e a dívida pública tem sido o principal recurso para o equilíbrio de contas públicas.
Referir que, segundo dados do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) até ao ano 2022, a dívida pública dos países africanos situava-se em 1,12 mil milhões de dólares, um aumento de cerca de 183% em relação ao ano 2010.
No seu discurso, Nuvunga não poupou os países mais desenvolvidos, referindo que estão interessados em explorar recursos dos países pobres e endividar para mantê-los sempre dependentes.
A finalizar, Nuvunga recordou aos presentes que é tempo de acordar e ficar em pé, porque África e Moçambique podem colapsar. No caso concreto de Moçambique, frisou que o país está num período eleitoral e pode ser uma oportunidade ímpar de mudar o rumo do país. Basta os moçambicanos aderirem à votação.
Com o tema: “a crise da dívida em áfrica: perspectivas e alternativas feministas Pan-Africanas – reconhecendo a necessidade crítica de abordar o défice em propostas alternativas, os impactos distributivos da crise da dívida e o enraizamento do modelo económico extractivo colonial que perpetua a subjugação das mulheres africanas” a AfCoDD IV tinha como objectivos primários desconstruir o pensamento macroeconómico dominante com uma lente alternativa feminista; oferecer princípios feministas para resolver o enigma da dívida e do desenvolvimento da África e quebrar as assimetrias de poder que marginalizam e minam estrutural e sistematicamente o papel das mulheres no desenvolvimento de África.