À margem do Workshop Nacional sobre o Sector Avícola, realizado, nesta quarta-feira, na Cidade de Maputo, o ministro da Agricultura, Ambiente e Pescas, Roberto Albino, foi confrontado pela imprensa com perguntas sobre dois escândalos que mancham a sua imagem e colocam em causa a credibilidade do actual Governo, nomeadamente: o polémico concurso público milionário promovido pelo Instituto de Algodão e Oleaginosas de Moçambique (IAOM) e o alegado abate ilegal de cerca de 20 metros cúbicos de madeira numa área de 50 hectares, executado pela empresa Ecofarm, sob sua orientação.
Contra todas as expectativas, o governante furtou-se a prestar qualquer esclarecimento, numa postura que tem sido vista como sinal de arrogância e de falta de transparência perante os moçambicanos.
Em relação ao primeiro caso, que diz respeito a um concurso público promovido pelo Instituto de Algodão e Oleaginosas de Moçambique (IAOM),no valor de 130 milhões de meticais, destinado ao desenvolvimento e operação de uma plataforma digital para as cadeias de valor do algodão e das oleaginosas, o concurso foi suspenso pelo Tribunal Administrativo, ao concluir que havia graves irregularidades.
O concurso em alusão foi ganho pela empresa Future Technology of Mozambique, criada a 8 de Abril de 2025 e detida por sócios ligados ao próprio ministro. A escolha desta empresa, sem historial técnico e com laços directos ao titular da pasta, levantou sérias suspeitas de conflito de interesses e favorecimento indevido.
O segundo dossier está relacionado com o abate ilegal, em 2024, de cerca de 20 metros cúbicos de madeira numa área de 50 hectares, executado pela empresa Ecofarm, alegadamente a mando de Roberto Albino, na qualidade de detentor de DUAT, quando ainda exercia funções como director-geral da Agência de Desenvolvimento do Vale do Zambeze.
Confrontado com estes assuntos, o ministro recusou-se a responder, limitando-se a dizer: “não sei de que está a falar, minha querida. Eu estive aqui muito concentrado na produção avícola. Se quiser falar sobre outras coisas que não sejam da avicultura, vamos arranjar um tempinho e podemos falar.”
Perante a insistência dos jornalistas, Roberto Albino foi prontamente protegido pelo seu assessor de imprensa, Dalfino Guila, que interrompeu os repórteres afirmando: “muito obrigado, colegas. O ministro agora tem uma reunião. Muito obrigado.”
A atitude “protectora” do assessor indignou a imprensa, que está ávida de respostas sobre os episódios acima referidos. Por outro lado, é curiosa, por vir de alguém que cuja trajectória está ligada ao poder no poder, basta lembrar uma investigação publicada pelo Centro de Integridade Pública (CIP) em 2023, apontando, entre outras figuras, Dalfino Guila como protagonista de práticas desviantes e lesivas ao Estado, incluindo fuga ao fisco.
Segundo o relatório do CIP, sustentado por auditoria do Tribunal Administrativo, Guila exerceu funções de assessor do então ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Celso Correia, e foi simultaneamente contratado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS) como consultor da Match Grants Unit (MGU) no programa Sustenta. Recebeu 55 mil dólares norte-americanos — cerca de 3,6 milhões de meticais — e deveria ter pago 722 mil meticais em IRPS. No entanto, declarou falsamente o rendimento como actividade de pequeno porte, pagando apenas 108 mil meticais e sonegando ao Estado 614 mil meticais.
O CIP destacou, na sua publicação, que a sonegação foi intencional e sistemática, envolvendo falsificação de declarações, uso indevido de regimes tributários e enriquecimento sem causa.
Apesar das evidências, não há indicação de que o Ministério Público tenha instaurado qualquer processo-crime contra Guila, nem contra outros implicados na mesma rede.
As penalidades previstas na Lei n.º 15/2002, que vão de dois a oito anos de prisão, além de multas e reembolso total ao Estado, nunca foram aplicadas. A omissão das autoridades é descrita pelo CIP como “silêncio cúmplice”, violando o artigo 47 da referida lei, que impõe o encaminhamento imediato dos autos ao Ministério Público.