Em apenas um dia, as manifestações provocaram dezoito mortos e 81 feridos, entre graves e ligeiros, 58 detidos, assalto a um posto policial, incêndio de dezenas de veículos, muitos dos quais de longo curso, na cidade da Beira, capital provincial de Sofala.
A acção dos manifestantes baralhou as autoridades que haviam montado o seu pessoal em pontos tidos como estratégicos e tradicionais focos de revoltas populares, tais como Munhava, Chipangara e Vaz. Contudo, não foram nos pontos tradicionais que foi accionado o rastilho. Grupos de jovens, que incluíam menores de idade, saíram de bairros menos propensos à violência, como Maquinino, Matacuane, Macurungo, Manga, Mobeira. Os mesmos actuavam recorrendo a métodos típicos de guerrilha.
Na mesma hora, um grupo saqueava produtos alimentares em armazéns nos bairros do Vaz e Mobeira. Por outro, outros incendiavam camiões de transportes de inertes e outros de longos curso ao longo da EN6.
De acordo com fontes policiais, cada vez se multiplicavam acções de vandalizações, e as vias eram obstruídas através de pneus e outros obstáculos.
Alguns elementos da polícia, que falaram para o nosso jornal na condição de não serem identificados, referiram que o assalto ao Posto Policial da Chota, naquela urbe, contou com a mão de menores de idade e adolescentes.
“Malfeitores colocaram menores de idade em frente para assaltar o Posto policial. Vimos que seríamos censurados pelos nossos superiores se abríssemos fogo contra aquele grupo social. Antes disparou-se para o ar, mas pareciam estar a brincar”, disse um dos elementos, que referiu ter-se resguardado, porque em seguida aparecia numerosos grupos com pedras e paus e outros com catanas.
HCB regista movimentos desusado
A propósito das mortes na fase de tratamento e feridos graves e ligeiros no leito hospitalar, a directora clínica do Hospital Central da Beira (HCB), Ana Tambo, explicou a jornalistas que os serviços de urgência e reanimação daquela unidade hospitalar registou um movimento invulgar no dia 23 de Dezembro. Deram entrada mais de 90 pessoas com ferimentos diversos devido a manifestações violentas.
Deste número de doentes, oito perderam a vida quando se encontravam a receber tratamentos, tendo ficado ainda no leito hospitalar um total de 81, entre graves e ligeiros.
Médicos e enfermeiros estagiários do HCB, falaram a nossa Reportagem que quase todos os feridos por baleamento, que vieram a perder a vida naquele unidade hospitalar tiveram aquele destino por falta de socorro, tudo porque as estradas possuíam barricadas e as viaturas eram alvo de arremesso de pedras e bombas molotov.
“Penso que os manifestantes não esperavam ter confrontações com a polícia, porque se eles soubessem, não teriam incendiado tudo que eles vissem a movimentar. Até autocarros do município, eles atacaram. Muitos chegaram ao hospital com pouca esperança porque perderam muito sangue e sem meios para os trazer”, disse, um dos aspirantes a médico, tendo apontado que certos feridos eram socorridos pela própria polícia.
Os beirenses resistiram este tempo todo em não participar em manifestações. Fala-se por toda a cidade que os pronunciamentos do edil, Albano Carige, sobre a possibilidade da Beira participar nas demonstrações, poderão ter accionado os manifestantes.
A propósito da relação causa-efeito entre as manifestações e as palavras de Carige, o sociólogo Elias Pedro lembrou que a comunicação das lideranças são importantes nos posicionamentos das massas.
“A cidade da Beira era vista como estivesse fora das manifestações violentas. Tudo estava calmo porque faltava o comando. É que o beirense sempre aguarda pelo comando de uma pessoa a quem respeitam. Já houve passeatas em que o presidente do município é a pessoa quem orientava. Eram manifestações pacíficas e eles respeitavam, mas neste momento, parece que o seu discurso, em função com as ameaças que recebia, não era apaziguador, daí que a sociedade faça a ligação entre o que ele disse e com as manifestações”, explicou o académico, enfatizando a necessidade de os líderes acautelarem seus discursos sob pena de causarem caos.