A velha questão da escassez de divisas no mercado nacional continua a dividir percepções e opiniões, opondo, essencialmente, o Banco de Moçambique (BdM) e a classe empresarial, representada pela Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA).
Nisto, depois de, na segunda-feira, o BdM ter dito que o mercado tinha divisas suficientes e, por isso, não constituía verdade a reclamação da CTA, esta última entidade veio, nesta quarta-feira, reiterar a sua posição sobre a escassez de divisas, particularmente o dólar americano, na banca comercial e no mercado em geral.
Essencialmente, os empresários levantam três grandes questões que, na sua visão, estão na origem da realidade de falta de divisas que se assiste no mercado.
Apontam, primeiro a forma como os contractos com os megaprojectos foram assinados e a prática daí resultante em relação à gestão de receitas geradas por estes projectos no negócio que resulta da exploração de recursos em Moçambique. Aqui está em causa o facto de os chamados grandes projectos usarem uma modalidade de facturação em que as receitas não ficam em Moçambique. É que, do ponto de vista do balancete entre as importações e as exportações, verifica-se uma cobertura de 25 por cento sem os grandes projectos. Mas, com os grandes projectos inclusos ter-se-ia uma cobertura de 90 porcento de exportações, faltando somente 10 para equilibrar a balança no que diz respeito às importações e às exportações.
“A análise destes dados pode significar, por um lado, que se os grandes projectos canalizassem, maioritariamente, a sua receita de exportação para o mercado interno, então, em média, o défice da oferta de divisas estaria estimada em 10%, contra os 75% sem os Grandes Projectos”, aponta a CTA, sugerindo a necessidade de medidas serem encontradas para garantir que as receitas que são geradas pêlos grandes projectos também sejam canalizadas na economia nacional.
Fora este ponto, a CTA olha para as medidas de gestão macroeconómica e financeira adoptadas pelo Banco de Moçambique de forma desconfiada e crítica. Aqui se aponta o facto de o Banco de Moçambique ter, por exemplo, aumentado a taxa de juro de reservas obrigatórias de 11,50% para 39,5%, pressionando a liquidez em moeda externa no mercado.
“Com base na conjugação das dinâmicas das importações e exportações, bem como do Mercado Cambial Interbancário e as conversões líquidas, pode-se inferir que os bancos comerciais têm baixa confiança em relação à capacidade do mercado de gerar divisas a curto prazo. Com o efeito, estão a ir ao público para comprar mais divisas dos clientes para aprovisionar e fazer face aos compromissos, resultando no aumento das conversões líquidas”, explica a confederação empresarial.
Por outro lado, há a questão da saída do Banco de Moçambique no aprovisionamento de divisas para a aquisição de combustíveis líquidos, deixando a responsabilidade a 100 por cento para as importadoras e os bancos. Em resultado, aponta a CTA, os bancos comerciais têm actualmente maior demanda de acumular divisas para garantir o financiamento ao processo de importação de combustíveis.
“Esse rápido crescimento da procura de divisas por parte dos bancos comerciais não foi acompanhado com o aumento das exportações, onde excluindo os Grandes Projectos, as exportações cobrem cerca de 25% das necessidades de importações”, refere, apontando o caminho para a necessidade de o Banco de Moçambique começar a sinalizar ao mercado, injectando parte delas para que os bancos comerciais ganhem confiança e usem a sua posição cambial positiva para apoiar as empresas.
A classe empresarial procura fazer compreender, no fim da sua comunicação, que não se está perante um exercício de confrontação, “mas, sim, de diálogo aberto e transmissão do sentimento do empresariado nacional que se sente sufocado com a situação que se vive no mercado de divisas”.
No pronunciamento feito na segunda-feira, o governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, negou a tese da escassez do dólar com base em argumentos da segmentação do mercado. Ou seja, ele defendeu a ideia de que o que acontece é que alguns bancos têm bastante divisas e outros não têm. Assim, segundo o BdM, o que os clientes devem fazer é ter disponíveis contas bancárias não somente em um banco, mas em vários, no sentido de se um tiver dificuldade de satisfazer as necessidades, imediatamente o cliente recorrer a outros.