“O assédio sexual na UEM está fora de controlo”. A afirmação, feita pela investigadora associada do Centro de Estudos Africanos (CEA), Natália Magaua, marcou o workshop sobre “Assédio Sexual: ética e deontologia profissional na gestão dos casos”, realizado nesta quarta-feira, em Maputo, pelo Centro de Coordenação dos Assuntos de Género (CeCAGe) e pelo Gabinete de Planificação, Qualidade e Estudos Institucionais (GaPQEI).
A académica denunciou a existência de docentes considerados “intocáveis”, que, apesar de múltiplas queixas, continuam impunes.
Segundo Magaua, embora a universidade disponha de um regulamento interno desde 2022, para prevenir e punir casos de assédio sexual, a sua aplicação é quase inexistente.
“Entre 2022 e 2025, não há registos de casos processados. Apenas dois tiveram desfecho formal, sem qualquer registo de advertências, suspensões ou expulsões. Estamos a cultivar uma cultura de impunidade na academia”, afirmou a investigadora associada do CEA.
Os estudos conduzidos pelo CEA revelam que a maioria das vítimas são estudantes do primeiro ano, maioritariamente mulheres jovens, com média de 23 anos de idade, ainda financeiramente dependentes das famílias. Muitas acabam por abandonar os cursos ou mudar de instituição, devido à perseguição e à falta de respostas institucionais.
Outro dado considerado preocupante durante o debate é a desinformação generalizada.
Regulamento interno
A maioria dos estudantes entrevistados desconhece os canais de denúncia, incluindo os pontos focais de género e o próprio CeCAGe.
“Alguns colegas de má-fé usam e abusam das nossas estudantes, porque sabem que elas não conhecem os mecanismos de protecção”, acrescentou Natália Magaua.
A falta de divulgação do regulamento interno é apontada como um dos principais entraves.
Apesar da existência de 11 faculdades e seis escolas superiores, com pontos focais de género, estes permanecem invisíveis.
Até mesmo membros do Conselho Universitário, revelou Magaua, admitiram desconhecer os seus representantes nesta matéria.
A directora do CeCAGe, Gracinda Matavel, sublinhou que “é preciso quebrar o silêncio e parar de culpabilizar as vítimas”, reforçando que o assédio sexual é crime e a responsabilidade nunca é da vítima.
No encontro, surgiram propostas como a criação de comités de supervisão, capacitação anual obrigatória para todos os funcionários e a implementação de uma rede de mentoria para apoiar os estudantes.
Foi ainda defendida a desconstrução da ideia de “feminização do assédio”, lembrando que também existem homens vítimas de violência sexual, embora tendam a silenciar-se.
Apesar da gravidade da situação, mantém-se uma sensação de frustração na comunidade académica.
“Queremos saber o que acontece com os docentes denunciados. A nossa instituição está estragada e precisa de recuperar a confiança dos estudantes”, exigiu uma das vozes presentes no debate.
O CeCAGe promete dar continuidade às discussões, com novo workshop agendado para o dia 3 de Setembro, que, desta vez, estará aberto aos estudantes e terá como foco a eficácia dos mecanismos de prevenção e combate ao assédio sexual.
(Helena Madança)